domingo, 25 de fevereiro de 2018

Entrevistando MAURÍCIO ROSA DE SOUZA

Maurício Rosa de Souza, 29 anos, natural do RS, é autor de dois romances: “Doce Sofia”, escrito no final de 2015 e lançado no final do ano de 2017 pela Editora Multifoco/RJ; e “Uma receita para a liberdade”, escrito em 2016, com lançamento previsto para março deste ano. Concluiu sua graduação no curso de Física Licenciatura Plena, na Universidade Federal de Santa Maria, em agosto de 2012. No primeiro semestre de 2013, ingressou no curso de pós-graduação (mestrado) em Geofísica do INPE, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e, em 2014, meados do segundo semestre, optou por não seguir mais a carreira científica. Foi quando adentrou no mundo da literatura, cujo fascínio vem desde a adolescência. Apaixonado não somente pela literatura, mas também pelas artes cinematográficas em geral, Maurício muda o rumo da sua carreira profissional, e começa sua investida em um universo completamente distinto. De estudante de exatas, torna-se escritor.

- Maurício, o que te motivou para deixar a carreira científica e se dedicar à Literatura?

Bom, primeiramente obrigado pela oportunidade, parabéns por seu trabalho de divulgação e pela publicação do seu romance A Última Chance.

A maior motivação para deixar a carreira científica foi o fato de que eu não estava feliz. Eu encontrava-me numa fase bastante conturbada da minha vida, na qual, eu nunca havia parado para perguntar a mim mesmo: “Então, Maurício, o que você quer fazer realmente da sua vida?” Quando eu fiz esse pré-questionamento, eu constatei que estava no lugar errado, fazendo o que não era de meu agrado e desperdiçando um tempo precioso. Voltei para o RS sem perspectiva alguma, sem ideia alguma de romance para escrever e o mais triste: visto como um derrotado. As pessoas diziam: “Caramba, ele morava em SP, estudava num dos melhores institutos de pesquisas do Brasil e agora está aqui em São Sepé/RS, novamente”. Lógico que eu nunca liguei para isso, até pelo contrário, isso serviu de combustível para eu dar a volta por cima e investir meu tempo naquilo que realmente importava para mim, que é escrever.


- Quais desafios precisou enfrentar para tal mudança?

Preconceito por não concluir o mestrado, na época, inúmeros amigos de “carreira científica” evaporaram, a minha ousadia virou um péssimo exemplo para o meio acadêmico. Nem emprego eu conseguia arrumar porque tinha estudos demais. Sem dúvida alguma o maior desafio foi fazer as pessoas respeitarem a minha decisão.

Outro grande desafio foi encontrar uma história original. Abordar um assunto que provocasse reflexão. Um livro que faria a pessoa, após finalizar a última página, ficar olhando para o teto, ou para a parede e pensando sobre o que leu. Sem clichê, eu queria algo que fosse profundo e foi isso que fez com que eu começasse a escrever “Doce Sofia” quase um ano depois de ter voltado para o RS. Eu tive inúmeras ideias, mas nenhuma era original. Enquanto essa ideia original não vinha, eu escrevia contos, e “Doce Sofia” era mais um destes contos, só que de repente ele já tinha 50 páginas. A ideia de abordar o tema de deficiência física nasceu depois que eu ajudei um rapaz a sair de uma loja que não tinha acesso para cadeirantes. A escada tinha cinco degraus e NINGUÉM da loja, se manifestou para ajudá-lo. Voltando para casa eu estava decidido a falar sobre o tema.

- Está feliz com a carreira de escritor? O que mais te satisfaz como profissional da escrita?

Muito feliz! Não existe algo que me satisfaça tanto, escrever é a melhor parte do meu dia. Eu não consigo não escrever. A grande satisfação é trabalhar sozinho, criar um universo só meu. Desabafar através dos personagens, expressar ideias e criar um mundo que existe, antes da publicação, só na minha cabeça. Outra grande satisfação é saber que em algum canto do país, alguém está sentado lendo meu livro. Não publiquei uma dissertação de mestrado, nem artigos científicos, mas publiquei meu primeiro livro e logo vem o segundo e tem vários contos publicados na internet também. A escrita me ajudou a dar a volta por cima.

- O que você enxerga como vantajoso e promissor, e como desvantajoso e prejudicial no ramo da Literatura? O que você acha que pode melhorar neste mercado para os escritores nacionais? Como você vê este mercado?

A vantagem é os meios de divulgação, sem dúvida alguma, um escritor atual tem muito mais recursos de divulgação do que os nossos contemporâneos. Hoje em dia, tem blog, sites, páginas de rede social, canais de vídeo e tudo mais que dão uma visibilidade enorme para o seu trabalho, tudo isso em pouquíssimos minutos, segundos.

A desvantagem é a literatura ter virado refeição para egos pobres de alma. Que nunca leram um Moacyr Scliar, Gabriel García Márquez, Guimarães Rosa, Machado de Assis entre outros. Para escrever algo bom, tem que ler algo bom. Isso serve para músicos, se você quer ser um bom guitarrista, tem que saber tocar as músicas da banda dos seus guitarristas preferidos. As editoras, não todas é claro, estão publicando muita coisa ruim. O livro é ruim, mas se o autor pagar os R$ 10.000 que ela pediu (digo isso, pois recebi propostas desse padrão para mais) eles colocam o livro até no programa do Faustão. Isso não é legal. Tem que ter qualidade e elas têm que investir mais nos autores nacionais. Tem muita gente boa, escrevendo coisas ótimas e que não conseguem espaço porque não tem dinheiro.

As melhoras poderiam vir com mais incentivos à leitura nas escolas, cursos de redação, feiras de livros com preços mais acessíveis, o processo de seleção das editoras ser mais rigoroso.

O mercado está muito concorrido e é uma concorrência desleal, pois sai na frente o dinheiro e não o talento. E isso é um reflexo que abrange vários ramos. A música está assim, a literatura está assim, e o cinema nacional também. Outro ponto que gostaria de tocar é o fato do pessoal escrever muita fantasia. O Brasil já está cheio de monstros, principalmente na política, e o pessoal fica criando mais. Tem tanto assunto interessante para ser abordado, nosso país está recheado de temas sociais que renderiam ótimos romances.


- Como admirador da Literatura e das artes cinematográficas, quais são seus gêneros literários favoritos, para ler e para escrever; e que tipo de filmes mais gosta de assistir? Você acredita no sucesso do cinema brasileiro?

Gosto de romances em geral. Porém, evito livros de autoajuda e biografias. Adoro romances completamente fictícios, ideias que saíram do autor e nada mais. “Cem anos de Solidão” é o melhor livro, na minha opinião, de todos os tempos. O universo de García Márquez é único, mesmo tendo como base a sua infância, ele lapidou a sua própria história e narrou uma das histórias mais geniais de todos os tempos. Outro livro que tenho como uma das maiores criações fictícias, é o romance “O Exército de um Homem Só” do Moacyr Scliar. Procuro ler esse tipo de literatura. Ideias que, mesmo sendo fictícias, de uma forma ou outra, estão ligadas ao cotidiano do leitor. Adoro os filmes do Martin Scorsese, ele é um dos poucos diretores que já passou por vários temas e sempre se saiu muito bem. E acredito, sim, no cinema brasileiro. Porém, acho que vai demorar para melhorar. É uma comédia atrás da outra, e os filmes mais legais nem entram em cartaz. O cinema no Brasil virou refúgio de desesperados, é tanto problema que o povo está cansado de chorar. Então, enfiam uma comédia atrás da outra.

- Como foi o processo de elaboração e desenvolvimento para a criação dos seus dois romances: “Doce Sofia” e “Uma receita para a Liberdade”? Quanto tempo levou para finalizar cada um deles? Para você, foi mais difícil escrever e finalizar o seu primeiro livro, ou a dificuldade foi a mesma para os dois? Se pudesse comparar, o que poderia dizer sobre a produção de cada um deles?

Muita leitura antes de começar a escrever. Muita revisão de capítulos e uma estratégia diária de escrita. Duas horas por dia. Sem estipular números de páginas e muito menos um prazo para finalizar o livro. Simplesmente duas horas diárias e pronto. Às vezes, ficava duas horas só olhando para o texto, mas estava ali mexendo nele. “Doce Sofia” eu levei sete meses para finalizar, muito devido à falta de experiência, e “Uma receita para a Liberdade”, três meses, pois é uma história menor, apesar de complexa e pesada. Mas eu já estava no embalo do primeiro romance, então estava bem melhor articulado.

Foi difícil finalizar os dois. Por que a história precisa ser contemplada do início ao fim. Tem que começar bem, desenrolar bem e principalmente finalizar bem. O enredo tem que ser linear, a pessoa tem que ser surpreendida. Como assim? Por exemplo, ela começa a ler o livro e logo está na página 50 sem ao menos se dar conta disso. Acredito que quanto mais tempo você levar para escrever um livro, melhor ele ficará.

Os temas são bem diferentes. Porém, “Uma Receita para a Liberdade” mexe muito com o meu emocional. Trata de um tema mãe-filho, perdas em todos os sentidos. O pessoal vai gostar, mas preparem-se que a história tem bastante espinho. “Doce Sofia” é superação, é você acreditar que a vida pode ser reconstruída, sim. Seja qual escolha você faça. Eu tirei uma lição do meu próprio livro. Já vendeu mais de 350 exemplares e até agora as críticas são só positivas. Procurei ser bem versátil de um livro para o outro. E minha ideia é essa: versatilidade. Para você ter uma ideia, meu terceiro livro já está pronto e fala sobre uma prostituta telepata. Cada livro será um Maurício Rosa diferente.

- Você teve algum tipo de incentivo e apoio para escrever os seus livros – não me refiro somente ao sentido financeiro, mas principalmente ao sentido psicológico, motivacional, e até mesmo de colegas do ramo com orientações, dicas e indicações, por exemplo -, ou fez tudo sozinho? Como surgiu essa vontade dentro de você? O que tinha em mente, inicialmente?

O maior incentivo veio da minha família e de dois amigos. Eles se chamam: Guilherme Grams e Miriele Amorim. Eles, desde que eu tomei a decisão de escrever em vez de pesquisar, me incentivaram. Ela lia tudo que eu enviava por e-mail e inclusive revisou “Doce Sofia”. Ele leu a versão final do livro e orientou que eu investisse nisso. Que eu tinha “a mão” para a coisa. ´Foi o único amigo que respeitou minha decisão e nunca contestou, até pelo contrário, louvou minha escolha, mas sempre cobrou que eu não ficasse parado no tempo. Eu tinha que fazer algo da minha vida.

Já, depois de publicado e lançado, aí sim eu comecei a trabalhar sozinho. Contatando jornais, blogues, youtubers, canais de TV, rádio e todas as mídias possíveis. O mais legal é que sempre tive respostas e hoje tenho bastante registro de resenhas, entrevistas, pois o pessoal acha muito interessante lançar um livro. Eu não culpo a editora em não me ajudar com isso, pois eu ganhei um contrato de publicação e não gasto nada com produção e tudo mais. Além disso, recebo direitos autoriais, mas eu tenho que fazer minha parte, que é divulgar. Agora, para o segundo livro (Uma receita para a Liberdade), vai ser muito mais fácil, pois tenho todos os contatos salvos e mais alguns novos que descubro todo dia. O trabalho é cansativo, mas é gratificante. Deu mais trabalho publicar e divulgar do que escrever. Sempre tive em mente, desde o início, publicar a história. Mas ainda assim é muito gratificante. Eu estou correndo atrás do meu sonho, eu tenho um objetivo na minha vida. Eu não estou apenas respirando e vivendo um dia após o outro. Eu quero que o dia seguinte seja diferente do anterior e, para isso, preciso me movimentar.


- Conte-nos um pouco sobre o enredo de “Doce Sofia” e de “Uma receita para a Liberdade”. O que leitor pode esperar de cada um deles. Qual a mensagem que eles trazem?

“Doce Sofia”: trata sobre uma jovem professora de Língua Portuguesa que tem uma vida toda planejada. Planos, metas e sonhos. Ela está morando com seu futuro esposo e, antes de casarem, ela propõe um teste de convívio de um ano. Porém, a Sofia, sofre um acidente e fica paraplégica. Com isso, o teste fica mais complexo ainda. Fora a deficiência, o estado julga, por ela ser deficiente, que Sofia não pode dar aula sentada numa cadeira de rodas. Então, em meio a um caos pessoal, ela sentada numa cadeira de rodas, vai fazer de tudo para reconstruir sua vida conjugal e recuperar seu emprego. O livro tem duas partes e cada uma delas possui uma “Sofia”. Pré-acidente, pós-acidente,  virada de personalidade, adaptação ao mundo dos deficientes, e a vida conjugal com Adam, seu namorado.

“Uma Receita para a Liberdade”: trata da história da Anabela Drummond. Uma ex- chefe de cozinha brilhante, premiada que, após engravidar e ser rejeitada pelo namorado e também perder seu irmão, rebela-se contra tudo e todos. Fora isso, Anabela tem que lidar com a mãe que tem obesidade mórbida. Tudo isso piora quando ela pratica um crime e vai parar numa clínica de reabilitação para psicopatas. A diretora dessa clínica conhece o trabalho dela como chefe de cozinha e propõe à Anabela preparar o cardápio para um dos concursos mais famosos do mundo. A diretora é também dona de um restaurante e amante de gastronomia. Em troca, a pena de Anabela será reduzida e ela terá a chance de ver seu filho que ficou sob os cuidados do serviço social. Porém, ela está numa clínica para “loucos” e nada vai ser simples para ela, principalmente lidar com a diretora que é a mais psicopata de todas.

- Você sempre teve esse sonho de escrever e publicar um livro? Como você descreveria a realização deste sonho?

Desde minha adolescência, antes eu não me imaginava escrevendo. Eu queria ter uma banda de rock. Depois que publiquei “Doce Sofia”, a imagem que tinham da minha pessoa, “o doido que abandonou SP”, desapareceu. E esse não era meu propósito, eu só queria publicar o livro e pronto. Foi consequência. Descrevo esse sonho como um divisor de águas na minha vida. Existe um Maurício antes de “Sofia” e outro completamente diferente após a publicação do livro. “Doce Sofia” me abriu inúmeras portas, fiz vários novos amigos e me deu a certeza de que é realmente isso que desejo para minha vida.

Fora isso, eu trabalho como professor de Física e Matemática. Abandonei a pesquisa, mas não a docência. Tenho meus alunos amados, que gostam de ler e me ajudam muito. E estou para viver uma nova experiência na docência, graças ao livro também. Jamais imaginei que atrás de um texto tão simples, mas elaborado com muito amor, tinha tanta coisa boa por vir.

- Como escritor, qual é a mensagem que você deixaria para os escritores nacionais que estão começando sua carreira na Literatura e estão buscando um espaço neste mercado?


Antes de escrever, leia. Seja crítico e peça para seus amigos e colaboradores que sejam críticos também. Não saia publicando qualquer coisa só porque tem condição de arcar com os custos. O livro é algo que ficará para sempre. Você precisa saber e caprichar no que estará escrito ali. Não se assuste com os “nãos” ou os e-mails não respondidos. O grande segredo é a persistência. “Doce Sofia” levou um ano e quatro meses para ser publicado. Tem editoras que até hoje não responderam meus e-mails. Eu varava noites escrevendo, abri mão de festas, viagens, para me dedicar a uma coisa que eu nem sabia se iria dar certo. Mas deu, pois o pensamento negativo era efêmero. Eu sempre acreditei no que estava fazendo.

Não tenha pressa para finalizar o livro, ele vai te dar sinais de que precisa de um fim. Escreva de maneira natural. Se estiver bloqueado, beleza, vá ver um filme, ler um livro, namorar. O bloqueio não dura para sempre, a não ser que você queira. Por último, prepare-se. Após a publicação, vem divulgação, críticas, glórias, decepções. Você precisa estar preparado. O meio artístico é muito complexo, por isso eu sugiro muita dedicação no que você está fazendo. Até hoje eu ainda me perco. Não escreva algo para ser passageiro na vida de uma pessoa. Escreva um livro que ela colocará na estante e sempre ser tocada pela capa ou as anotações que fez da leitura. Não escreva para inflar seu ego. Escreva para alimentar e incentivar as esperanças e sonhos do seu leitor. Eu não escrevo para ganhar dinheiro, ficar famoso, ganhar Jabuti, e muito menos ser amigo de atores famosos. Escrevo por amor e para as pessoas que dedicam seu tempo a degustar minhas histórias e amam, assim como eu, um bom livro.


Muito obrigado.





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